quinta-feira, 9 de setembro de 2010

A.A.Ponte Preta

Em pé: Carlos, Juninho, Nenê, Humberto, Odirlei e Toninho Oliveira
Agachados: Serginho, Marco Aurélio, Oswaldo, Dicá e João Paulo

Dicá
Mestre que é mestre nunca se cansa de passar sua sabedoria aos outros; e esses ensinamentos podem vir através de cobranças de faltas precisas, chutes fortes e colocados, garra, humildade, suor e vibração, muita vibração. É por tudo isso que a torcida da Ponte Preta faz questão de manter acesa e brilhando a estrela do maior jogador da história do clube, Oscar Sales Bueno Filho, o inesquecível Mestre Dicá.

Garoto levado, que preferia nas peladas de rua na cidade de Campinas jogar no time dicá e não no dilá, por puro charme, ganhando o apelido que iria torná-lo para sempre respeitado nos gramados brasileiros. Jogando e encantando no Santa Odila, clube varzeano da cidade, foi levado em 1966 para defender a Ponte Preta. A estrela meteórica participou de apenas sete jogos pela equipe de juniores da Macaca e foi logo integrado ao time principal, com 19 anos de idade. Começava ai uma linda história de amor entre um craque e um clube.

A camisa da Ponte Preta parecia inspirar ainda mais o talento de Dicá: jogando na meia direita e com liberdade para criar as jogadas do ataque pontepretano, ele foi responsável por uma reforma estrutural no time do Moisés Lucarelli. Antes de Dicá, a Ponte teimava em contratar jogadores famosos e experientes, mas com este camisa 10, a diretoria do clube implantou uma nova filosofia para conquistar títulos acreditando nos novatos. O resultado foi o respeito e a projeção do clube no cenário futebolístico paulista e nacional e o Acesso à Primeira Divisão do Campeonato Paulista em 69.
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Em 71, Dicá teve uma passagem discreta no Santos de Pelé, Clodoaldo, Carlos Alberto, Rildo, Edu e Cejas. Mesmo tendo poucas oportunidades de mostrar suas habilidades, nada mal para um jovem jogador, que recebeu elogio até do Rei do Futebol: "Durante uma partida em Recife contra o Sport me sai muito bem e assim que terminou o jogo o Pelé me chamou de lado e me entregou sua camisa, dizendo que era um prêmio por ter sido o melhor jogador em campo e responsável pela vitória santista. Aquilo me emocionou muito, afinal, era o Pelé", recorda.

Mas era apenas na Macaca que Dicá justificava o futebol que o transformou em Mestre: quando foi defender a Lusa (72-76), amargurou o banco de reserva e assim como no Peixe, era escalado como meia esquerda, com os técnicos pedindo para que o craque desse combate, que se preocupasse em defender, e não atacar. Por isso, parecia mesmo sina brilhar com a camisa 10 da Ponte Preta: "Sabe como eu jogava nesse time? Era dali pra frente. Sem preocupação de voltar muito, até a área da gente, sem ser obrigado a marcar o tempo todo, correndo atrás do adversário, mais preocupado em não deixar fazer do que fazer. O que me prejudicou nas outras equipes foi esse negócio de mudar a maneira de jogar: eles queriam que eu jogasse da minha área até o meio do campo. Só até ali. Quer dizer, exatamente o contrário do que eu estava acostumado a fazer e do que eu gostava", explica Dicá, que também assistiu de camarote uma transferência sem sucesso para o Fluminense.

Se teve um capricho extracampo que Dicá nunca fez questão de negar foi o gosto por uma boa cerveja. Enquanto muitos achavam que o jogador perdia a forma física ideal de brilhar dentro de campo, o meia se defendia: "Quem é que, gostando, deixa de tomar sua cervejinha e seu vinho? Só mesmo o mentiroso. Eu gostava e tomava mesmo. Ainda tomo, como sei que a maioria toma. O importante não é tomar na frente dos outros, fazendo às escondidas. O certo é não se ir além do normal. É não passar daquele limite que não faz mal".

Mas e os títulos? O time da Ponte Preta comandado por Dicá era uma verdadeira máquina, tamanho o brilho e o toque encantador nas jogadas que resultava nos gols da equipe. Mas se tem uma tristeza que o Mestre guarda é não transformar em pó a angústia dos torcedores da Macaca por não conquistar o título dos Campeonatos Paulistas de 70,77,79 e 81. Era sempre um lance, um nervosismo a mais, uma falta de experiência, uma marcação individual, um juiz que atrapalhava e deixava a Ponte com o vice-campeonato.

Na decisão de 79, contra o Corinthians, era clara a irritação de Dicá contra o zagueiro Caçapava, uma sombra dentro de campo, escalado pelo técnico Osvaldo Brandão para impedir o Mestre de armar as jogadas da Macaca: "Caçapava suma do meu lado e procure jogar sua bola sem ser carrapato. Tenha um pouco de vergonha e mostre alguma coisa para a sua torcida", era lição que o professor com estilo próprio e inconfundível dava, desesperado com a marcação que recebia do zagueiro corintiano, na decisão vencida pelo Corinthians.

Mas se o que realmente importa é o troféu de campeão, Dicá conquistou o Campeonato Paulista de 73, defendendo a Lusa, que ficou com o título daquele ano com o Santos.

Em uma coluna escrita para o jornal A Gazeta Esportiva do dia 15 de maio de 98, o Mestre Dicá afirmou: "O jogador cerebral está em extinção, se é que já não foi extinto. Jogadores como Gérson, Rivelino e Ademir da Guia já não existem mais". Saudoso por jogadores e jogadas brilhantes, Dicá sabia exatamente que essa grande safra também foi responsável pela sua maior frustração como atleta: nunca ter sido convocado para defender a seleção brasileira de futebol.

Ele sabia que por mais que se destacasse e se esforçasse, o Brasil tinha apenas uma seleção, e inúmeros craques. "Eu tive essa ilusão. Já cheguei a me abater por não ter sido lembrado para a seleção e ficar horas em profunda depressão emocional. Mas nada como a seqüência dos jogos e campeonatos para nos fazer voltar à rotina de nossa profissão e esquecer as decepções". Só mesmo um Mestre como Dicá para aceitar com tanta humildade o que a cartilha do futebol escreveu em sua história.

Fonte: http://almalusa.net